NO REINO DA IMPUNIDADE… VALE TUDO

A UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite em Angola, pediu ao juiz presidente do Tribunal Supremo (TS), alegadamente envolvido em actos de corrupção e nepotismo, que “abandone o cargo” e a “colabore com as autoridades” na busca da verdade sobre as suspeitas. Simples? Seria se, de facto e de jure, Angola fosse o que não é, uma democracia e um Estado de Direito.

O grupo parlamentar da UNITA diz que as notícias sobre a crise no poder judicial, nomeadamente os tribunais Supremo e de Contas (ambos órgãos afectos ao MPLA e cujos presidentes resultam exclusivamente da escolha pessoal e partidária do Presidente João Lourenço), cujos presidentes são citados em escândalos de corrupção, mancham o seu bom nome, das referidas instituições e do país.

Em nota de imprensa, os deputados da UNITA exprimem enorme preocupação pelo facto de tal situação comprometer o funcionamento normal das instituições, pôr em causa os pilares do Estado democrático e retrair o investimento externo.

O Presidente do MPLA, João Lourenço, anunciou, em finais de Fevereiro, que convidou a então presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa, a renunciar ao cargo no dia 21 de Fevereiro devido a várias “ocorrências” que a envolviam, mas a juíza só iria demitir-se dias depois, após ter pedido jubilação antecipada e ter sido constituída arguida.

A responsável está indiciada pelos crimes de extorsão, peculato e corrupção, num processo em que é igualmente arguido o seu filho Hailé Vicente da Cruz.

Joel Leonardo, juiz presidente do TS, tem sido, há meses, acusado de estar alegadamente envolvido em actos de corrupção, nepotismo, má gestão do órgão e outros, factos que já levou a Associação de Juízes de Angola a pedir investigação por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR).

A UNITA, no comunicado, solicita também à PGR um “esclarecimento público e urgente” a respeito de alegadas investigações sobre as denúncias em torno de Joel Leonardo, pois “trata-se de um assunto relevante de interesse público, salvaguardando, porém, o segredo de justiça e a presunção de inocência”.

“Do mesmo modo, o grupo parlamentar da UNITA espera elevação do até agora juiz-presidente do TS, Joel Leonardo, colocando o seu cargo à disposição e colaborando com a Justiça para que se apure a verdade dos factos, pois as notícias sobre suposta fuga do mesmo e a negação ao dever de colaboração com a instituição competente apenas retardam o esclarecimento da verdade material”, refere-se no comunicado.

O grupo parlamentar do principal partido da oposição entende ainda que os recentes pronunciamentos do Presidente da República (à RFI), “que não reconhece a crise institucional que o país vive”, revelam o “proteccionismo e a selectividade que têm marcado a actuação do executivo e do judicial no que ao combate à corrupção diz respeito” e “consolida a cultura de impunidade, favoritismo e compadrio”.

A UNITA defende também que a resolução “dos graves problemas do poder judicial e da crise de justiça” são “reveladores do falhanço do Estado” e “exigem uma profunda reforma” a ser liderada por novos atores políticos e novos operadores do sistema de justiça.

Recorde-se que, entre outras organizações que defendem a legalidade, a transparência e as regras de um (verdadeiro) Estado de Direito, também a associação Pro Bono Angola apelou ao Presidente da República, igualmente Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo, para que preste atenção e mande investigar denúncias contra o juiz presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, acusado de estar supostamente implicado em vários crimes.

Em comunicado, a Associação para o Bem de Angola, organização não-governamental (ONG) angolana de defesa dos direitos humanos manifestou “imensa preocupação” com “as inúmeras e constantes denúncias anónimas (algumas até conhecidas)”, de “vários estratos da sociedade angolana, relacionadas com a pessoa do Dr. Joel Leonardo”.

A associação sublinha que nas vestes de venerando juiz conselheiro presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo “tem a ingente responsabilidade de pautar a sua conduta com base em elevadíssimos princípios éticos, deontológicos e estatutários, que advém da função de juiz (moralidade pública, irrepreensibilidade, ética, probidade, dever de reserva) e que, por sua vez têm raízes constitucionais”.

“A Pro Bono Angola, instituição defensora dos direitos humanos, da transparência, da ética, da integridade e da responsabilidade nos actos de gestão pública, está profundamente preocupada com o ‘estado actual’ da judicatura em Angola, pois, entende que, sem um poder judicial imaculado, forte, verdadeiramente actuante e comprometido” com os valores citados, todo o “esforço de moralização pública e combate ferrenho à corrupção cairão por terra”, lê-se no seu documento.

Neste sentido, a ONG apela ao Presidente que “faça atenção às denúncias, mande investigar e tome as medidas que se justifiquem, visando pôr cobro aos males que enfermam a judicatura”.

Recorde-se que o grupo parlamentar da UNITA já no passado dia 7 de Fevereiro tinha pedido a demissão do presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, alvo nos últimos tempos de várias denúncias de suposta má gestão e corrupção.

Aposição foi na altura expressa pelo líder do grupo parlamentar da UNITA, Liberty Chiaka, numa conferência de imprensa em que abordou a crise de confiança social nas instituições da justiça, órgãos de segurança e alguns departamentos ministeriais.

“Não se pode compreender, aceitar, que todos os meses saiam notícias envolvendo o presidente do Tribunal Supremo”, disse o líder parlamentar.

Segundo o deputado, compete à Procuradoria-Geral da República (sucursal, tal como o Tribunal Supremo, do MPLA) apurar as denúncias tornadas públicas.

“É o que estamos a exigir. Infelizmente, há provas que são públicas de alegado favorecimento de familiares directos do senhor presidente do Tribunal Supremo”, disse Liberty Chiaka, frisando que não se pode “colocar o nome de pessoas acima dos interesses nacionais”.

O responsável disse ainda que “não faz bem à República de Angola, não faz bem ao poder judicial, que o presidente do Tribunal Supremo, que também é o presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) ter o seu nome permanentemente ligado a escândalos de corrupção”.

“Afasta investimentos, coloca em causa a credibilidade, ela por si só já maculada, não faz bem a nós. Em defesa do bom nome do próprio presidente do Tribunal Supremo colocava o lugar à disposição”, salientou.

De acordo com o líder do grupo parlamentar da UNITA, “esses casos não são de hoje nem de ontem”, lembrando que há um discurso público e oficial de combate à corrupção.

“E não se pode fazer combate à corrupção sem um poder judicial independente, sem que os seus agentes tenham autoridade moral, não se pode fazer. Quando a autoridade moral, ética, dos agentes públicos, particularmente dos operadores de justiça fica em causa, todo o sistema de justiça fica em causa, e todo o discurso público, oficial, a propaganda, ficam em causa”, observou.

“Estamos aqui para reafirmar a nossa posição: exigir demissão do senhor presidente do Tribunal Supremo. Angola não pode mais continuar nessa condição. O que se espera dos operadores de justiça é concentração, administrar a justiça, gerir os conflitos, não é gerir a imagem, apagar fogo, que envolve os próprios operadores de justiça, assim não há combate à corrupção e não se pode fazer justiça”, defendeu.

Folha 8 com Lusa

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